21 e 22 de junho de 2012, auditório 1A do Centro de Atividades Didáticas (CAD) UFMG, Belo Horizonte MG

O Camundongo Como Organismo Modelo – Indução de Novas Mutações


   A geração de camundongos mutantes que recapitulam doenças humanas vem contribuindo enormemente para o estudo funcional de inúmeros genes. A utilização de ENU (ethyl–N–nitrosourea) como agente mutagênico e a análise fenotípica juntamente com a genotipagem dos animais mutantes auxiliam no isolamento de novos genes ou novos alelos de interesse e no estabelecimento de novos modelos para o estudo de doenças genéticas humanas. Sendo assim, um projeto denominado "O camundongo como organismo modelo – Indução de novas mutações", desenvolvido em parceria pelo Laboratório de Genética Animal e Humana (LGAH) do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG e o Departamento de Imunologia do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, objetivou a indução de diferentes mutações no genoma de camundongos, utilizando-se o agente mutagênico N-etil-N-nitrosourea (ENU). Neste projeto, foram obtidos 11 mutantes com fenótipos de interesse, selecionados para mapeamento genético e clonagem posicional, com o intuito de gerar modelos animais para patologias genéticas humanas. Dentre estes, 4 modelos são foco de estudos em nosso laboratório:

Fraqueza

   A mutação fraqueza é herdada de forma autossômica recessiva e caracteriza-se por perda progressiva da força muscular e da coordenação motora na cauda e nas patas. O quadro é observado a partir da primeira quinzena de vida e o animal morre por volta da décima segunda semana. A análise dos cortes histológicos do tecido muscular mostrou células de menor diâmetro e com endomísio espesso, indicando um provável processo reparativo. Nota-se uma discreta redução do diâmetro neuronal no corno posterior da medula e alterações degenerativas muito discretas em algumas amostras desta região e aumento da celularidade na região central dos gânglios sensitivos da raiz dorsal dos nervos espinhais. A análise de ligação permitiu o mapeamento da mutação no cromossomo 1, entre os marcadores D1MIT373 (10.92 cM) e D1MIT320 (18.64 cM), delimitando uma região de 7.72 cM, região esta onde se encontra o gene Bpag1, candidato funcional e posicional para a mutaçao Fraqueza. Este gene possui 107 éxons abrangendo cerca de 400Kb, localiza-se a 12,91 cM e é responsável, entre outras funções, pela integridade e organização da arquitetura celular. O gene apresenta-se em quatro isoformas principais: Bpag1a, Bpag1n, Bpag1b e Bpag1e, sendo expressas no cérebro (1a e 1n), músculo e pele, respectivamente.

Sacudidor de Cabeça

   A mutação Sacudidor de Cabeça é uma desordem autossômica dominante, gerada a partir de indução de mutação através da administração do agente alquilante etil-nitrosourea (ENU) em camundongos. O camundongo sacudidor é caracterizado pelo movimento anormal de cabeça e pescoço, para cima e para baixo, repetitivamente. No entanto, os mutantes se desenvolvem normalmente, são férteis e possuem tempo de vida normal. O presente projeto tem como objetivo a identificação e caracterização da mutação responsável pelo fenótipo sacudidor de cabeça, através do mapeamento genetico, avaliação de quantidade de transcritos dos genes candidatos e o isolamento e sequenciamento do gene mutado. A identificação da mutação do modelo Sacudidor de Cabeça proporcionará estudos que visem o entendimento funcional do gene mutado bem a elucidação de processos biológicos

Rodador

   A mutação rodador é uma desordem monogênica, autossômica recessiva, caracterizada por perda auditiva, comportamento circular e disfunção de equilíbrio. Análises histológicas do aparelho vestíbulo-coclear revelam estereocílios anormais. Estudos de mapeamento genético por análise de ligação e caracterização de genes candidatos permitiram identificar uma alteração de um único nucleotídeo no gene da Protocaderina 15 (Pcdh15) nestes animais. Este projeto objetiva validar esta alteração através do sequenciamento de cDNA proveniente de amostras do ouvido interno dos camundongos, e de testes de PCR em tempo real para avaliar os níveis de expressão de Pcdh15 para camundongos controle e mutantes. Além disso, estão em andamento análises de Western Blot para avaliação das quantidades da proteína encontradas nos animais. A protocaderina 15 é um membro da superfamília das caderinas, moléculas responsáveis pela adesão célula-a-célula dependente de cálcio, e é componente dos filamentos extracelulares que controlam a morfogênese e função dos estereocílios das células mecano-sensórias do ouvido interno. No homem, mutações no gene PCDH15 causam perda auditiva e Síndrome de Usher tipo 1F (USH1F). A validação desta mutação tornará o camundongo rodador um bom modelo para a doença, permitindo estudos dos mecanismos envolvidos na mecanotransdução, na função auditiva e no desenvolvimento da síndrome.

Careca

   A mutação Careca é uma desordem autossômica recessiva caracterizada primariamente por uma evidente rarefação de pelagem por todo o corpo. Os camundongos carc/carc apresentam esta pelagem rarefeita por toda a vida, com distribuição uniforme, e nunca apresentam pelagem completa. Essa distribuição dos pelos é observada a partir da primeira pelagem. Por volta dos 45-60 dias, alguns camundongos ficam completamente sem pelos e, a partir desta idade, voltam a apresentar o mesmo padrão de rarefação corporal. O crescimento da pelagem em camundongos ocorre em um padrão composto por fases alternadas de crescimento e descanso. Este ciclo é periódico e se prolonga da região da cabeça até à cauda, ao mesmo tempo em que vai da região ventral para dorsal. Além de alterações de pele, os mutantes carc apresentam glomérulos com membrana basal espessada e aumento de celularidade em cortes histológicos de rim de animais com três meses de vida, o que caracteriza um quadro de glomerulonefrite membrano-proliferativa. Os mesmos animais mostraram também linfonodos hiperplásicos, embora ocorra distribuição normal de linfócitos T, B e macrófagos. A análise de ligação delimitou um intervalo de 5,56 megabases, que possui homologia de sintenia com o cromossomo 10q26 humano. Todos os elementos genéticos identificados neste intervalo, incluindo genes, pseudogenes e marcadores, foram avaliados cuidadosamente com o intuito de selecionar um bom gene candidato. O melhor candidato selecionado, dentre todos os genes da região, foi o gene Fgfr2 (Fibroblast growth factor receptor 2), que apresenta um importante papel no desenvolvimento embrionário.

 


 

Alcoolismo

Obesidade, Álcool e Dano Hepático: Estudo da Expressão Gênica de Marcadores Inflamatórios em Modelo Murino

O alcoolismo é uma desordem complexa, caracterizada pela ingestão excessiva de álcool, que afeta milhões de indivíduos no mundo. O consumo excessivo de álcool é a maior causa de doenças hepáticas crônicas nos países ocidentais, com um espectro variável de manifestações, envolvendo esteatose, esteatohepatite, fibrose e cirrose. A complexidade dessa síndrome exige o estudo de mecanismos envolvidos em diferentes estágios da doença. A gravidade e o prognóstico são dependentes do consumo, frequência e duração do abuso do álcool. Adicionalmente, com o crescimento dos problemas de obesidade, estima-se que 20% da população apresenta doença hepática não alcoólica. A obesidade e as doenças metabólicas associadas estão entre as mais comuns e deletérias patologias humanas, que afetam mais de 50% da população adulta. Essas condições estão associadas a respostas inflamatórias crônicas caracterizadas pela produção anormal de citocinas, aumento dos marcadores pró-inflamatórios de fase aguda e a ativação dos sinalizadores inflamatórios. As duas síndromes apresentam similaridades, com a tendência em aceitar para ambas o mecanismo de two hit model, no qual o acúmulo de gordura associado à liberação de endotoxinas induz um processo inflamatório. Diante do crescimento dos problemas de obesidade, associado ao consumo de álcool, torna-se interessante investigar o surgimento da doença hepática, com ênfase nos processos inflamatórios no tecido hepático e tecido adiposo, na tentativa de elucidar os mecanismos moleculares envolvidos neste processo.

 


Desenvolvimento de uma linhagem congênica deficiente para o gene da interleucina 10

Camundongos deficientes em interleucina 10 (IL-10) desenvolvem enterocolite espontânea marcada por hiperplasia de células epiteliais e por inflamação transmural (Kuhn et al., 1993). A linhagem knockout existente para o estudo de doenças relacionadas à regulação pela interleucina 10 (129 Sv/Ev IL-10 -/-) desenvolve de forma mais branda alergia alimentar e retrocolite ulcerativa, enquanto o modelo BALB/c manifesta as mesmas características de maneira mais severa. O desenvolvimento de um modelo BALB/c IL-10 -/- é essencial para uma melhor compreensão dos mecanismos imunológicos relacionados a essas doenças. Por meio de retrocruzamento, será possível desenvolver o modelo BALB/c IL-10 -/- através da técnica “speed congenic”, na qual a região cromossômica que contém o locus diferencial na linhagem doadora (129 Sv/Ev Il-10 -/-) será introduzida no genoma da linhagem receptora (BALB/c IL-10 +/+) em um menor período de tempo (6 gerações). Serão realizados, inicialmente, cruzamentos entre as linhagens doadora e receptora; os heterozigotos (F1) gerados serão retrocruzados com a linhagem BALB/c. Os filhotes (N2) passarão por um processo de seleção (genotipagem com marcadores específicos para o gene da IL-10 e marcadores microssatélites) para o próximo retrocruzamento a ser feito (também com a linhagem BALB/c). Serão selecionados os indivíduos N2 que portarem o gene “defeituoso”, em heterozigose, e maior porcentagem de homozigose para a linhagem BALB/c. Estes serão retrocruzados com o parental BALB/c. Esse protocolo será repetido a cada nova geração e em 18 meses de retrocruzamentos obteremos a linhagem congênica desejada.